A crise económica mundial, a desregulação dos mercados, as vantagens principescas dos gestores das instituições financeiras apontados como responsáveis pelos empolamentos ficcionados dos produtos e lucros, com a imoral distribuição de dividendos, como sucedeu recentemente com dinheiros dos contribuintes norte-americanos que se destinariam a evitar a falência, são exemplos, entre muitos, que levam as populações a esconjurar os políticos e as suas opções.
O poder de compra das famílias, de forma geral, associado à boa ou má performance das empresas e da criação de riqueza por uma nação, tem baixado drasticamente, provocando mudanças bruscas de hábitos e consumos e colocando em crise compromissos por elas assumidos. Este cenário agrava-se, significativamente, como é fácil de inferir, com a situação desemprego, pois aí em vez de redução do ganho, passa a viver-se de subsídios ou do amealhado, havendo-o.
Nestas alturas, tudo se questiona, a bondade das políticas seguidas até aí, as medidas que se estão a tomar para superar ou menorizar a crise, a Ordem monetária e económica mundial, o poder das nações e Estados. É a dicotomia Norte e Sul, povos ricos e pobres, Estados produtores e detentores da matéria-prima, a nível planetário, ou de classe social num contexto mais restrito. Ou noutro contexto próximo, a existência de espaços de livre circulação, como Schengen, em contraponto às barreiras que no Norte de África impedem o acesso à Europa. Tudo, dizem vozes escutadas, pode levar à proliferação de gritos de revolta, fazendo juz ao brocardo: “em casa em que não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”.
É, por isso, sem mais comentários, que reproduzimos o extracto, sempre actual, de Viagens na minha Terra:
“E eu pergunto aos economistas políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar a miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico?
- Que lho digam no Parlamento inglês, onde, depois de tantas comissões de inquérito, já devia andar orçado o número de almas que é preciso vender ao diabo, número de corpos que se tem de entregar antes do tempo ao cemitério para fazer um tecelão rico e fidalgo como Sir Roberto Peel, um mineiro, um banqueiro, um granjeeiro, seja o que for: cada homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis.
Almeida Garrett, in 'Viagens na minha Terra'”
E, ainda noutro registo, não menos sarcástico, de Guerra Junqueiro:
“Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, (…) um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, (…)”
Guerra Junqueiro, Pátria, 1896
O poder de compra das famílias, de forma geral, associado à boa ou má performance das empresas e da criação de riqueza por uma nação, tem baixado drasticamente, provocando mudanças bruscas de hábitos e consumos e colocando em crise compromissos por elas assumidos. Este cenário agrava-se, significativamente, como é fácil de inferir, com a situação desemprego, pois aí em vez de redução do ganho, passa a viver-se de subsídios ou do amealhado, havendo-o.
Nestas alturas, tudo se questiona, a bondade das políticas seguidas até aí, as medidas que se estão a tomar para superar ou menorizar a crise, a Ordem monetária e económica mundial, o poder das nações e Estados. É a dicotomia Norte e Sul, povos ricos e pobres, Estados produtores e detentores da matéria-prima, a nível planetário, ou de classe social num contexto mais restrito. Ou noutro contexto próximo, a existência de espaços de livre circulação, como Schengen, em contraponto às barreiras que no Norte de África impedem o acesso à Europa. Tudo, dizem vozes escutadas, pode levar à proliferação de gritos de revolta, fazendo juz ao brocardo: “em casa em que não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”.
É, por isso, sem mais comentários, que reproduzimos o extracto, sempre actual, de Viagens na minha Terra:
“E eu pergunto aos economistas políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar a miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico?
- Que lho digam no Parlamento inglês, onde, depois de tantas comissões de inquérito, já devia andar orçado o número de almas que é preciso vender ao diabo, número de corpos que se tem de entregar antes do tempo ao cemitério para fazer um tecelão rico e fidalgo como Sir Roberto Peel, um mineiro, um banqueiro, um granjeeiro, seja o que for: cada homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis.
Almeida Garrett, in 'Viagens na minha Terra'”
E, ainda noutro registo, não menos sarcástico, de Guerra Junqueiro:
“Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, (…) um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, (…)”
Guerra Junqueiro, Pátria, 1896
Eça de Queiroz também descreve a crise social em vários das suas obras... A ler e a reler, sempre actual.
ResponderEliminarTem a Drª Cristina inteira razão (nem podia ser de outro modo sendo, como é, uma estudiosa do autor) em dizer que Eça foi também um escritor cuja dimensão social e moral o levou a questionar as sociedades que conheceu, em especial a lisboeta. Perseguiu, diz-se, o então pensamento social europeu, onde as ideias de reforma social e política mergulhavam num realismo crítico-social. Preocupou-se, nos seus escritos, com a qualidade de vida das diferentes classes sociais e o conformismo social e político. Toda a sua obra está pejada de sátira, As Farpas, Fradique Mendes e Conde de Abranhos, são só alguns exemplos conseguidos da crítica social.
ResponderEliminarDurão Barroso, Presidente da Comissão Europeia, cita Eça no seu discurso (SPEECH/06/283, Comemorações do dia 9 de Maio, Centro Cultural de Belém, 8 Maio 2006) “Num artigo publicado n’ O Repórter, dizia Eça de Queiroz: “A crise é a condição quase regular da Europa (…) todos sofrem de uma crise industrial, de uma crise agrícola, de uma crise política, de uma crise social, de uma crise moral (…) a situação da Europa é medonha. Sob as crises que a sacodem, já a máquina se desconjunta. Nada pode deter o incomparável desastre, que todavia, no fundo a situação é simplesmente normal. Natural e normal.”