domingo, 1 de março de 2009

Ainda o egoísmo, agora em Pessoa


Também Fernando Pessoa escreveu sobre o egoísmo. Para ele, o egoísmo circunscreve-se à sua dedicação às artes da escrita que o retiram da convivência social e da preocupação com as coisas mais comuns e banais do dia a dia. Ainda assim, não se considera mais egoísta que os outros, sobretudo comparativamente com os seus pares nas artes e nas letras. Deixou- nos:
Egoísmo relativo

Por mim, o meu egoísmo é a superfície da minha dedicação. O meu espírito vive constantemente no estudo e no cuidado da Verdade, e no escrúpulo de deixar, quando eu despir a veste que me liga a este mundo, uma obra que sirva o progresso e o bem da Humanidade. Reconheço que o sentido intelectual que esse Serviço da Humanidade toma em mim, em virtude do meu temperamento, me afasta, muitas vezes, das pequenas manifestações que em geral revelam o espírito humanitário. Os actos de caridade, a dedicação por assim dizer quotidiana são cousas que raras vezes aparecem em mim, embora nada haja em mim que represente a negação delas.
Em todo o caso, reconheço, em justiça para comigo próprio, que não sou mais egoísta que a maioria dos indivíduos, e muito menos o sou que a maioria dos meus colegas nas artes e nas letras. Pareço egoísta àqueles que, por um egoísmo absorvente, exigem a dedicação dos outros como um tributo.
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Fernando Pessoa, in 'Notas Autobiográficas e de Autognose'

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